O ronco pode parecer que é apenas um barulho que incomoda a quem está dormindo ao lado. No entanto, o ronco é um problema complexo, que pode causar ruídos de intensidade similar aos de uma esquina barulhenta, com graves reflexos no casamento e no relacionamento social, além de ser sinal de obstrução respiratória, com sérias repercussões no organismo.

Na última década, com os avanços no estudo do sono, o ronco deixou de ser encarado apenas como um barulho para se tornar um sinal de alerta que, eventualmente, pode indicar uma doença grave, a apnéia do sono (interrupção da respiração por mais de 10 segundos). Uma série cíclica de roncos, seguida por um silêncio respiratório (apnéia), terminando com uma respiração explosiva, por vezes com despertar breve, face ao movimento do corpo, é sugestiva da SAOS – síndrome da apnéia obstrutiva do sono!

Além de não conseguir aprofundar o sono, o roncador tem despertares noturnos e sensação de “afogamento”. Ocorre sonolência durante o dia e redução no rendimento psico-intelectual; por ter reduzida a saturação de oxigênio no sangue, o ronco está frequentemente associado à hipertensão arterial, arritmias e outros problemas cardio-vasculares.

Esses pacientes necessitam de uma avaliação médica especializada. Além da anamnese detalhada e do exame físico realizados no consultório, outros exames podem ser solicitados para aprimorar o diagnóstico e orientar o melhor tratamento para cada caso. Nesse arsenal estão a vídeo-endoscopia nasal, a vídeolaringoscopia, exames de imagem e a polissonografia, que compreende um registro contínuo e simultâneo das variáveis fisiológicas durante o sono.

O ronco não tem uma, e sim múltiplas causas, todas relacionadas com obstrução das vias respiratórias, com consequente vibração dos tecidos moles e aparecimento de ruído. Portanto, cada indivíduo ronca por um somatório diferente dessas inúmeras causas.

A causa mais comum entre os roncadores é obesidade relativa, sem querer dizer que o problema seja exclusividade dos gordinhos! Os magros também têm os seus motivos para roncar. O fato é que, para respirarmos, precisamos expandir os pulmões contra a pressão positiva do abdome, resultante do gás do tubo digestivo. Para isso, contamos com o auxílio da musculatura respiratória (diafragma, músculos intercostais, abdominais, etc…). Quando estamos em pé, ainda contamos com o auxílio da gravidade, enquanto deitados, dependemos exclusivamente da nossa musculatura. Assim, nos indivíduos obesos, com flacidez muscular, gordura abdominal e muitos gases no tubo digestivo, o esforço respiratório é muito maior. O quadro é agravado após refeições copiosas antes da hora de dormir, nas situações de stress e com a ingestão de bebidas alcoólicas, que relaxam a musculatura em geral.

Esse esforço respiratório soma-se ao estreitamento das vias respiratórias, que pode ocorrer em vários níveis: no nariz (alergias, desvios do septo, pólipos, sinusite, adenóides…), na faringe (flacidez do véu do paladar, hipertrofia da úvula , hipertrofia das amídalas…), na produção excessiva de secreções, nos problemas de mandíbula, de oclusão dentária e queda da língua, nos pulmões (fumo, bronquites…), etc…

Esse estreitamento pode ocorrer em diferentes graus de intensidade e, nas formas mais graves, pode levar à apnéia, geralmente por colapso do véu palatino ou queda da língua sobre a parede da faringe, num mecanismo valvular. Paciente com problemas de mandíbula e/ou língua podem beneficiar-se com o uso de aparelhos intra-orais, aplicados pelo ortodontista. Já os pacientes com apnéia intensa podem necessitar do auxílio de respiradores de pressão positiva  – CPAP (do inglês, Continuous Positive Air Pressure) para dormir, evitando a falência de todo o sistema cárdio-respiratório.

Alguns casos, como desvios do septo, sinusites crônicas, polipose nasal e hipertrofia de amídalas e adenóides, podem ser tratados cirùrgicamente. A plástica da úvula (campainha) e do véu do paladar, conhecida como “cirurgia do ronco”, quando o excesso de tecido mucoso e gorduroso, responsável pela vibração e aparecimento do ruído durante a respiração, é removido, pode ser muito útil em alguns casos selecionados.

Por outro lado, o paciente deve entender que o tratamento do ronco é um “pacote” de medidas, que incluem emagrecimento orientado, mudança de hábitos, abolir o fumo e o alcool, exteriorizar o stress, atividade física-respiratória rotineira e tratamento clínico das demais causas coadjuvantes.

Cabe ao paciente conhecer a sua doença e ter o propósito de melhorar, controlando duas outras doenças paralelas, a “preguicite aguda” e a “falta de tempo para si mesmo”. Cabe ao médico, utilizando todos os recursos diagnósticos de que dispõe, analisar cada caso, oferecendo as melhores alternativas para o tratamento do ronco e das apnéia.